Indígenas Pataxó manifestam-se em frente ao STF contra o marco temporal e pela demarcação das terras do povo. Crédito da foto: Guilherme Cavalli/Cimi


 A Polícia Federal esteve na manhã desta quinta-feira (27) na aldeia Novos Guerreiros, Terra Indígena Coroa Vermelha/Ponta Grande, em Porto Seguro (BA), para intimar as famílias Pataxó a se retirarem da área que ocupam. Na terça-feira (25), venceu o prazo de cinco dias dado pela Justiça Federal de Eunápolis para a saída espontânea dos Pataxó. Os policiais informaram que a aldeia tem 24 horas para ser desfeita sem o uso da força.

Há controvérsias e irregularidades na medida da Justiça Federal, que atende proprietários de um Clube de Aviação. A decisão pelo despejo contraria o Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu quaisquer ações de reintegração de posse enquanto durar a pandemia. O julgamento ocorreu no início de maio como apêndice do processo de Recurso Extraordinário 1.017.365/SC.

Nesta manhã, reafirmando o determinado pelo STF e a tradicionalidade do território, os indígenas se negaram a assinar a intimação levada pelos policiais federais. Conforme as lideranças, a comunidade não fez parte do acordo firmado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) e Ministério Público Federal (MPF) durante audiência com o juiz Federal Pablo Enrique Carneiro Baldivieso no último dia 20.

Os Pataxó se surpreenderam ao ouvir dos policiais que a aldeia precisava ser despejada porque os indígenas ocupam a pista de pouso do Clube de Aviação. Os indígenas estão em uma área ao lado, conservando distância da pista. “Tão atacando um direito nosso, essa é a verdade. E não assinamos a intimação porque não fomos chamados para a audiência ou para fazer acordo. Só fomos informados depois. A Funai não pode decidir por nós. Ela que assine essa intimação”, explica o cacique Ararawe Pataxó.

Mais cedo, 92 entidades dos movimentos sociais, universidades, fundações e organizações não governamentais assinaram um manifesto puxado pelo Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (Mupoiba), Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme) e Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá (Finpat).

Nela o grupo repudia a decisão da Justiça Federal e pede às autoridades competentes que tomem “providências para que os direitos dos Pataxó sejam garantidos e a decisão do Supremo Tribunal Federal sejam respeitadas”.

Leia na íntegra:

 

NOTA DE SOLIDARIEDADE AO POVO PATAXÓ E DE DENÚNCIA À VIOLAÇÃO DE DIREITOS

As entidades abaixo assinadas repudiam e denunciam mais uma violência contra o Povo Pataxó no extremo sul da Bahia. A Aldeia Novos Guerreiros, que faz parte do território Ponta Grande, foi surpreendida no último dia 20 de agosto de 2020 com a notícia de uma reintegração de posse, autorizada pelo juiz federal Pablo Enrique Carneiro Baldivieso, da Justiça Federal de Eunápolis. A área que será reintegrada abriga, atualmente, 24 famílias.

O conflito judicial envolvendo a área resulta da inércia da FUNAI em regularizar totalmente a terra indígena Coroa Vermelha, em Porto Seguro-BA. Como, a despeito da previsão da Constituição Federal, os limites do território não foram revistos a ponto de garantir a reprodução cultural dos Pataxó, essas famílias retomaram tal área há mais de ano e, em plena pandemia da COVID-19, estão vendo seu direito ao território ser negado mais uma vez.

A decisão do juiz vai de encontro a uma decisão do Ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal – STF, que, no dia 06 de maio deste ano, decidiu em tutela provisória suspender nacionalmente os processos judiciais que podem causar prejuízo aos direitos dos povos indígenas, como é o caso desta reintegração de posse enfrentada pela Aldeia Novos Guerreiros. Conforme a decisão do STF, todas as reintegrações de posse contra indígenas no Brasil devem ficar suspensas até que seja julgado o Recurso Extraordinário 1.017.365/SC, que possui caráter de repercussão geral e definirá a posição do Supremo Tribunal Federal sobre o direito originário dos povos indígenas sobre seus territórios, ou até que a pandemia da COVID-19 acabe – o que vier por último.

Assim, a decisão do juiz de Eunápolis deve ser modificada para atender a decisão do próprio Poder Judiciário e garantir os direitos do povo Pataxó.

É importante, também, que o Ministério Público Federal de Eunápolis, que participou da audiência do dia 20/08, cumprindo seu papel constitucional, solicite a retratação da decisão judicial, uma vez que ela contradiz decisão de alcance nacional. Caso necessário, a comunidade solicita em nota que as instâncias superiores do MPF posicionem-se pela permanência das famílias da Aldeia Novos Guerreiros em seu território.

Aproximadamente 25 famílias Pataxó são colocadas em risco direto por essa decisão do juiz federal de Eunápolis, sendo consideradas invasoras de seu próprio território. Mais do que isso, diante do momento pandêmico, elas são potenciais vítimas deste terrível vírus que avança diante da inoperância dos órgãos que deveriam garantir proteção e cuidado com as vidas e saúde dos indígenas. Além disso, quando algumas famílias são expulsas, todo o território é desrespeitado.

Por fim, conclamamos as autoridades competentes a tomarem providências para que os direitos dos Pataxó sejam garantidos e a decisão do Supremo Tribunal Federal sejam respeitadas.


POR RENATO SANTANA, DA ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO – CIMI



Postado Por Tapicuru.


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