Após normativa da Funai, fazendeiros certificam 58 propriedades sobre terras indígenas na Bahia



 As certificações de propriedades privadas sobre as terras indígenas do sul e extremo sul da Bahia aumentaram consideravelmente após a publicação da Instrução Normativa (IN) 09/2020 pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Entre 22 de abril, data em que a medida foi publicada, e o dia 10 de agosto, 58 propriedades privadas foram certificadas sobre terras indígenas dos povos Pataxó e Tupinambá.

As informações foram obtidas com base no banco de dados públicos do Sistema de Gestão Fundiária do Incra, o Sigef. As Terras Indígenas (TIs) mais afetadas são as vizinhas Barra Velha do Monte Pascoal, com 41 certificações sobrepostas, e Comexatibá, com um total de dez certificações aprovadas após a publicação da instrução normativa. Ambas as terras pertencem ao povo Pataxó e ficam localizadas nos municípios de Porto Seguro e Prado.

Na TI Barra Velha do Monte Pascoal, identificada e delimitada pela Funai com 52.748 hectares, as parcelas certificadas pelo Incra somam 9.148 hectares – a maioria integralmente sobreposta à terra indígena, que é uma revisão dos limites da TI Barra Velha, demarcada na década de 1980 com 8.627 hectares.

Desde que a antiga demarcação foi feita, os Pataxó lutam pela correção dos limites da área, indicando que grande parte do seu território tradicional ficou de fora da primeira delimitação. A reivindicação dos indígenas foi reconhecida pela Funai em 2008, com a publicação do relatório circunstanciado da terra indígena. As fazendas certificadas pelo Incra sobrepõem-se apenas à área da nova demarcação, que ainda não está regularizada.

No caso da TI Comexatibá, com 28.077 hectares também já identificados e delimitados pela Funai em 2015, as dez certificações sobrepostas ao território tradicional e aprovadas após a publicação da normativa somam um total de 2.296 hectares.

“Essas certificações de fazendas são muito preocupantes para a gente”, afirma Mandy Pataxó, liderança da aldeia Mucugê, na TI Comexatibá. “Porque além dessa sobreposição pesada em cima do nosso território, que vem degradando e destruindo nossa área, a gente vê que eles [fazendeiros] têm se fortalecido, especialmente nesse momento da covid-19, em que as atenções estão focadas para isso e o governo tem feito ações contrárias aos povos indígenas”.

Mandy explica que nove aldeias Pataxó ocupam, hoje, cerca de dois mil hectares da TI Comexatibá. “Na outra parte do território, temos sobreposição com o Parque Nacional do Descobrimento, Projetos de Assentamento Rurais e o latifúndio, que são os fazendeiros. Fora isso, existe a especulação imobiliária por parte do setor hoteleiro, porque temos mais de 23 quilômetros de praia dentro do território”.

Passe o mouse sobre as terras indígenas no mapa para ver informações sobre os territórios. Clique nas propriedades para ver informações sobre as certificações.


Corrida por certificações

Antes da edição da IN 09 pela Funai, havia apenas três certificações do Sigef incidentes sobre terras indígenas na Bahia: duas na TI Comexatiba, anteriores à publicação do relatório de identificação e delimitação do território pela Funai, e outra, de 2016, apenas parcialmente sobreposta à TI Caramuru/Paraguassu, já regularizada.

Havia também outras 15 propriedades certificadas entre 2008 e 2013 pelo Sistema Nacional de Certificação de Imóveis (SNCI), antecessor do Sigef, em sobreposição com as TIs Caramuru/Paraguassu, Tumbalalá, Tupinambá de Olivença, Barra Velha do Monte Pascoal e Comexatibá.

Logo após a publicação da normativa da Funai, entretanto, as certificações de fazendas sobre terras indígenas do estado explodiram. Foram 35 apenas na semana em que a medida foi publicada, entre 22 e 30 de abril, e outras oito na semana seguinte, nos dias 5 e 6 de maio.


Fonte : Simi


POR TIAGO MIOTTO, DA ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO DO CIMI

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